AS MINAS DE MASSUEIME, OS MINEIROS SAMARRAS E MINÉRIOS, DO AMBLIGONITE AO URÂNIO
Continuação da 2ª. parte.
Com o decréscimo da exploração mineira na zona de Massueime e minas que a ela estavam associadas, embora fossem explorações completamente distintas e independentes, cerca de 1956 começaram os trabalhos de preparação, para a exploração do jazigo das Minas de Urânio da Sra. das Fontes, que se situam no planalto contíguo à colina da Rasa, no sítio da Torre, mais conhecido por Tapada dos Ermitães e a sua exploração estendeu-se até à década de 1980.
O interesse pelo urânio em Portugal começa a verificar-se em 1944 e a primeira companhia a fazer a prospecção, pesquisa e reconhecimento de jazigos de urânio, foi a Cª. Portuguesa de Radium, Lda, em consórcio com empresas inglesas. Tudo o que se relacionou com a exploração do urânio, até 1962, foi de iniciativa privada, altura em que a J.E.N.- Junta de Energia Nuclear, que havia sido criada em 1954, tomou conta desta indústria mineira, tendo de imediato procedido a pesquisas em várias zonas do país, nomeadamente na zona centro, onde estiveram em actividade, em simultâneo, mais de 60 minas.
Em 1977 a JEN foi substituída na actividade produtiva pela E.N.U.- Empresa Nacional de Urânio, E.P. e em 1990 é transformada em E.N.U., S..A. Em 1992 o seu património foi integrado na holding mineira estatal, a E.D.M.- Empresa de Desenvolvimento Mineiro S.A. e dissolvida em 2004. A mineralização uranifera ocorre exclusivamente nas rochas xistentas (xistos negro-acinzentados, grafitosos muito brandos e xistos castanhos, ferruginosos – Barros 1966). Daí a necessidade de se fazer o entivamento dos tetos das minas com madeiras, para protecção dos mineiros. O jazigo uranifero das Minas da Sra. das Fontes situa-se num pequeno retalho do complexo Xisto-Grauváquico, ocupando uma faixa com cerca de 190m por 10m, com direcção N85ºW e com uma profundidade para além dos 120m.
Minas da Sra. das Fontes, 1967 |
Agosto de 1968 |
O poço principal da mina tinha cerca de 90m de profundidade e com várias minas ramificadas e galerias, possuindo 3 chaminés.
A exploração, como vimos, fazia-se por lavra subterrânea e em dois turnos de laboração, com dezenas de mineiros samarras, mineiros de aldeias vizinhas e não só.
Inicialmente e durante alguns anos, o urânio aqui extraído era transportado para as minas da Urgeiriça, cuja oficina tinha capacidade de tratamento químico de 100 toneladas de U3O8 dia, tratando os minérios de 10 minas.
Posteriormente, foi instalada na mina do Prado Velho – Guarda, uma fábrica de tratamento de urânio, que pouco depois foi transferida para a mina da Sra. das Fontes. Esta fábrica tinha capacidade para tratar 40 toneladas dia e passou também a tratar o minério das minas da Cunha Baixa, Cruz da Faia e Cótimos. Quando a profundidade já não permitia a sua exploração, ou a sua rentabilidade já não o aconselhava, passaram a usar a lixiviação “soluções ácidas” que, circulavam pelas zonas fracturadas e dissolviam o urânio, cujos líquidos eram apanhados no fundo do poço, sendo bombeados e tratados na oficina de concentração, “as chamadas Químicas” e a sua produção mensal chegou a ser de cerca de 300kg.
Pelas 11h30, era vermos as mulheres samarras, irmãs e filhos, pela encosta da Rasa acima, com a cesta à cabeça ou no braço, levando o almoço ao seu homem, irmão ou pai e quem tinha dificuldade em subir a encosta, ou tinha o pão na hora de o tender para o levar para o forno, pedia à vizinha para lhe levar a cesta para o seu familiar e a solidariedade samarra não falhava.
Os riscos para a saúde dos mineiros, nesta lavra, foram muitos e muitos conterrâneos nos deixaram mais cedo do que seria suposto, com o que se denominou o “mal da mina” e foram mais de um dezena. Para estes Mineiros Samarras, que muitos de nós conhecemos e recordamos com saudade, fica aqui a nossa homenagem.
Dois dos mineiros Samarras por adopção de casamento foram, o capataz Alfredo Simão e António J. Pereira, este, aqui na foto, tomando um dos seus bagacitos diários, no café do Zé Ferreira, que, diz ele, espantam todos os males.
António J. Pereira |
Como curiosidade, diz-se que a localização exacta deste filão ocorreu nas seguintes circunstâncias; Andava um engº. e o seu ajudante nas pesquisas, quando este sentiu necessidade de se retirar para trás de uma moita de carvalhotos, para baixar as calças e se aliviar e ao pousar o aparelho “o cintilômetro”, este começou a apitar ruidosamente, indicando que estava precisamente no sítio que procuravam, o filão de urânio, logo, o filão foi descoberto “a cagar”.
Como alguém diria “as melhores práticas - do berço ao caixão”, nem sempre foram respeitadas e as Minas da Sra. das Fontes ficaram ao abandono, com elevado risco para a saúde pública. Até que em 25/ 02/2010 o ilustre conterrâneo, Professor Engº. Delfim Carvalho, na qualidade de Presidente do Conselho de Administração da EDM- Empresa de Desenvolvimento Mineiro, S.A, colocou um ponto final a décadas de abandono, ao deslocar-se a Pinhel e na presença do Presidente da Câmara de Pinhel, António Ruas, do Presidente da Junta de Freguesia de Santa Eufêmia, Delfim Júlio e de Francisco Mendo, na qualidade de representante da Comissão da Fábrica da Igreja, assinaram o acto de consignação da empreitada de remediação ambiental da antiga área mineira da Sra. das Fontes, ao consórcio Jeremias de Macedo & Cª. Lda / Mt3- Engenharia e Obras, Lda, empreitada orçada em cerca de 2.300.000.00€uros, com um prazo de execução de 365 dias.
Situação final |
Esta foto demonstra como ficou a área depois da sua recuperação, vislumbrando-se em baixo a aldeia.
A tradição, como dizem os antepassados, tem muito valor e os nossos ancestrais sempre tiveram em boa conta, os valores ou ditos, que os seus maiores lhes transmitiram.
A tradição, como dizem os antepassados, tem muito valor e os nossos ancestrais sempre tiveram em boa conta, os valores ou ditos, que os seus maiores lhes transmitiram.
Sempre nos referiram, que a aldeia primitiva ter-se-á localizado na zona do sítio, agora, denominado de Santa Ofêmia, cerca do cemitério velho, e perto da Villa Romana, contígua ao filão do urânio, posta a descoberto aquando da prospecção deste filão urânifero, pois era costume, nos tempos dos romanos, estas vilas instalarem-se perto das populações locais, que também lhes serviam de apoio. A via Romana de Almeida a Marialva e Lamego passava pela aldeia Samarra. Hoje, restam-nos retalhos de calçadas romanas e a ponte romana medieval de Massueime.
Quando éramos garotos e nos deslocávamos com o “vivo” para estas pastagens no lugar da Torre, recordo-me de termos reparado numa “era” num barroco e os cacos de cerâmica e de barro eram muitos e numa vasta extensão. Mais tarde, já como estudante descobri ali, gravadas num barroco, duas palavras, cujo registo ainda guardo num pequeno apontamento e que anotei como sendo: LHADEOIT e TABANICU. Recentemente, 2004, os arqueólogos dizem-nos:
“Villa Romana, (Habitat Calcolítico e Idade do Bronze), ocupando uma área de cerca de 7 hectares, correspondendo a uma villa romana ou uma aldeia com uma villa nas proximidades.
Tendo em conta o aparecimento de sigillata clara D, apontamos para uma ocupação do local pelo menos no século IV-V., d.C.
Foram observados vestígios de cerâmica de fabrico manual, bases de colunas, pedras de canais e escória, etc..
Cerca da estação localiza-se uma inscrição gravada com duas hipóteses de leitura:
1- DI(S) LEIA DEDIT PABANICUS (vel PARANICUS).
2- DI(S) LEIA DEDIT PABANIC(us) (vel PARANIC(us) V (otum) s (olvit).
1- Pabanico (ou Paranico) ofereceu aos deuses Leia e
2- Leia ofereceu aos deuses e Pabanico cumpriu o voto.”
(Fonte: Direcção-Geral do Património Cultural).
Esperamos com estas crónicas, ter contribuído de alguma maneira, para salvaguardar as memórias das Comunidades Mineiras Samarras, nos períodos das suas explorações. Às Enciclopédias Samarras ainda vivas, que viveram e testemunharam estes fatos um Bem-Hajam.
Abril 2013 (21)
Apaulos
Grande pesquisa. Desconhecia estas fotos, nunca tinha visto as minas com casas em pé.
ResponderEliminarParabéns.
acabei de imprimir este artigo, deveras interessante. Vou juntá-lo aos outros já também impressos. Muito bom.
ResponderEliminara foto da aldeia e da mina vistas do ar dá a sensação que caiu ali uma pequena bomba atómica. Está ali um vazio medonho onde nem ervas daninhas lá nascem!
ResponderEliminarE nós lá no fundinho a absorver todos os "nutrientes" que a mina nos leva através dos cursos de água.
Admiro-me como é que ainda não nos extinguimos. Somos bem rijos!
não admira que haja tanta gente queimadinha! Parecendo que não vivemos em cima de um vulcão activo e ninguém dá por isso...
ResponderEliminarDeve ser da qualidade da uva
ResponderEliminaraquele clarão parece a plataforma logistica da Guarda
ResponderEliminarObrigado António Paulos por me teres lembrado parte da minha infância! O meu futuro e demais passou por aqui. Os 17 anos em que o meu pai aqui trabalhou recordam-me muitas peripécias, algumas das quais tu relatas! Mas também me trazem mais saudades de quem partiu cedo e...tenho quase a certeza, em consequência desta actividade perigosa!
ResponderEliminarA Aldeia deve parte do seu progresso a estas minas, incluindo a chegada da Electricidade, pois as minas não podiam funcionar sem ela e o desvio era só um "saltinho" como ainda se pode constactar nos postes a partir da Ermida! No entanto não pode descurar os vestígios "nucleares" que certamente ainda por ali existem e...os cuidados serão sempre poucos!
Abraço
..."Delfim Júlio e de Francisco Mendo, na qualidade de representante da Comissão da Fábrica da Igreja, assinaram o acto de consignação da empreitada de remediação ambiental da antiga área mineira da Sra. das Fontes, ao consórcio Jeremias de Macedo & Cª. Lda / Mt3- Engenharia e Obras, Lda, empreitada orçada em cerca de 2.300.000.00€uros, com um prazo de execução de 365 dias".
ResponderEliminarPOIS ENTÃO, A TERRA DE CULTIVO DA CERCA SERVE PARA TAPAR BURACOS DE RADIOTERAPIA!!!!! GATUNOS TERROSRISTAS dO LEGADO É O QUE SÃO.
Enquanto posta diplomacia para parecer filantropo, tenha mais espírito crítico na sua intervenção da NARRATIVA. não seja tão distante do comum dos cidadãos.
Não sou perito na matéria, mas será que o anónimo do comentário anterior, estará abalizado para ajuizar e nos esclarecer o que teria sido pior para a aldeia? A charca como alguém já a chamou ou o abandono
ResponderEliminara que foi votado aquele antro, a descoberto, de actividade radioativa. Pelo que nos recorda o autor da crónica, teve um investimento bem avultado, e presume-se que ao deslocarem todas aquelas toneladas de terra o devem ter feito porque não havia alternativas? Alguém,com responsabilidade na matéria nos pode esclarecer este assunto?
Com estas crónicas sobre as Minas, o Blogue e o Apaulos, já tiveram o mérito de despertar consciências adormecidas, para uma época única na vida da Aldeia Samarra e de Pinhel, que durou quase um século. Foi o período em que esta aldeia foi a mais populosa do concelho. Aqui, aconteceram muitos sacrifícios e tb. alguns progressos; Mas,muitos de nós vimos os nossos parentes deixarem-nos mais cedo,de certo,por causa desta actividade.Despertem,agora,as consciências de quem nos "governa" e perpetuem, esta época Samarra e dos seus Mineiros.Caso contrário,mais umas dezenas de anos e jamais alguém se recordar deste património.
ResponderEliminarSrs. Presidentes da Junta e da Camara, tenham o brio de aporem os vossos nomes no Monumento que perpetue e respeite a memória da Comunidade Mineira Samarra e do seu Concelho, aquando da sua inauguração.De certo que terão o apoio de toda a população e as autarquicas estão à porta. O local da Praça seria boa hipotese.
não seria necessário muito dinheiro, penso eu
Eliminarpor certo aquele não seria o único lugar para ir buscar terras, era sim o que ficava mais perto
ResponderEliminargrande momento do jota pereira...
ResponderEliminarComo querem que algo se faça quando o modus operandi na aldeia é silencioso.
ResponderEliminarO caso da charca, é o que sabemos. O caso da união das fregusias, nem burro se queres água. As obras do salão, idem aspas aspas. Estamos a falar de um caso da comissão, o outro da junta e o salão uma união entre os dois...
Nada é discutido na praça pública. Se calhar o espaço mais democrático de Santa Eufêmia é este blog.
Refira-se que sou a favor do monumento ao mineiro.
Amigo Apaulos: Um bem haja, por estas tuas crónicas, que servindo para recordar memórias do passado, que é ainda bem presente, servem também para de uma forma didáctica, revelar ás gerações mais novas, algo que faz e sempre fará parte da História da nossa terra,
ResponderEliminarTodos os que vivemos naquele tempo ficaremos para sempre com uma imagem indelével e como tal, nem o tempo apagará, por motivos vários....
Um monumento ao Mineiro, ainda que pequenininho, algo simbólico ou qualquer outra coisa, seria uma questão de Justiça!.
Saudações Samarras
Celestino Rodrigues
Não há Samarra, na Aldeia ou nas cinco partes do Mundo, que não tenha tido alguém na família; Avô,pai,irmão,tio ou primo e que não tenha estado ligado à actividade mineira. Todos foram camponese-mineiros, para nos proporcionarem, a nós, uma perspectiva melhor de vida. Cabe à Aldeia Samarra no seu colectivo, perpetuar a sua memória com um monumento, por mais singelo que seja como diz "CR", e nós que somos testemunhas vivas dessa vida dura e para muitos, mais curta que o expectável, tudo faremos para que as autoridades tenham isso em conta.
ResponderEliminarGraças a Deus há tantos Samarras bem na vida, que de certo estarão disponiveis para que esta homenagem aconteça. Sr. Presdente da Junta, procure apoio, una esorços e elejam uma comissão credível para poderem começar a dar vida a um lindo projeto.
Muito boa ideia.
ResponderEliminarTambém apoio! O Largo da Praça, tal como já vi por aqui sugerido era um excelente sítio, desde que reformulado e melhor aproveitado!
ResponderEliminarum filão descoberto a "cagar", muito bom.
ResponderEliminarse tivessem deixado de m#rdas teria sido bem melhor. Olha que a fonte da juventude não a descobriram eles, nem a mijar.