Há dias ouvi um jovem dizer: quando vou à terra dos meus pais, só vejo vinhas e olivais. Cerca de 1975, levei de Lisboa para a aldeia uma criança, a pedido do pai, António Ribeiro de saudosa memória, para junto dos avós e ele dizia que ali não havia montras, eram só barrocos.
Um e outro têm razão, mas razões em tempos diferentes.
Os barrocos já sobressaíram, quais manequins na grande montra que era a Fareleira em que o manequim mais vistoso dá pelo nome de “lage da galé”, quando apareciam isolados no meio da ondulação do centeio de espigas alouradas, que os rodeavam e não como hoje ocultos pelo mato e silvas que os sufocam; porque os nossos avós e pais os escavavam, para em seu redor espalharem a semente do centeio, que depois de segado “ceifado” pouco mais dava que aquela, valendo a palha para os animais.
Também, muitos dos grandes olivais e vinhas de hoje, só ganharam expressão e dimensão após as décadas de 1970. Agora e de há cerca de uma década, as vinhas também já estão em declínio, devido ao seu envelhecimento e consequente abandono dos seus proprietários, mais envelhecidos que estas e os jovens que temos referido terem dado outro rumo às suas vidas, salvo raras excepções.

A menina da Maçã – 1981 na Ribeira.

Pelos anos 60/70 e durante cerca de uma década e meia, os melhores terrenos da aldeia estavam ocupadas com pomares de macieiras, sobretudo das qualidades Golden Delicious e Starting. Foi quando nós aprendemos mais cedo que outros garotos, que havia maçãs de várias qualidades e não peros.
Agora voltámos aos anos antes 1960/70, em que apenas existe uma aqui outra acolá, para consumo familiar, nomeadamente as Bravo de Esmolfe ou esmofe como se dizia, as Reinetas, as Fruta Nova, as “Monteiras” - nome indígena - aqui representada por um magnifico exemplar, que ficavam farinhentas lá para o fim do Outono/Inverno, quando eram consumidas e apreciadas, sobretudo a quem os dentes já faziam falta e que, umas e outras eram espalhadas e guardadas no cimo do monte das batatas até serem consumidas; nomeadamente na altura da apanha da azeitona e que serviam para acompanhar o pão, à hora do almoço e que também eram dadas aos garotos, bem como figo secos, na altura dos Reis que os pediam de porta em porta.

Um digno exemplar de uma macieira Monteira – Mortórios - 1973.

As variedades que mais se cultivam na Beira Alta e com IGP (indicação geográfica protegida), são: Golden, Gala, Red Delicious, Starting, Jonagold, Granny Smith, Jonared e Reinetas.
Os pomares na aldeia estendiam-se das olgas da Ribeira à Lameira de Cima, passando pelo Ribeiro Prado, os Pomares da Casa Grande, Lameiro Trigo, Vinha de Ordem, Pontinhas, Maregedo, Lameira de Baixo, Silveira e Horta Longe. Para quem tem noção da localização destes locais, verifica que a aldeia Samarra era um grande pomar de Macieiras, terrenos que na sua maioria vieram a dar lugar a vinhas e olivais, decorados nos seus limites com marmeleiros que não precisam dos cuidados que as suas primas macieiras exigem e que nem sempre se apanham por o seu preço ser tão baixo, por vezes uns míseros 0,08/0,10 cêntimos, quando chegam ao consumidor a valores de cerca de 2 euros.
As maçãs Starting, de coloração vermelha e pequenas manchas esverdeadas e de cor verde e amarelo/rosadas as Golden, ambas de calibre grande, de textura consistente, suculentas, de sabor doce e paladar agradável.
As poucas que chegavam a Lisboa, nomeadamente aos mercados, na altura, Frutas Almeida, eram rotuladas com grandes cartazes; maçãs da Guarda ou da Beira Alta o que era garantia de escoamento garantido.

Pomar no segundo ano de vida – Lameira de Cima - 1972.

Então porque é que os Samarras desistiram dos seus pomares das “Malus Domestica Borkh”?
Com a expansão dos pomares na zona do Oeste do País e com uma melhor ligação rodoviária à Europa, as excelentes e inigualáveis maçãs samarras perderam o seu mercado, não porque tenham perdido qualidade, mas porque os comerciantes diziam que não podiam concorrer a vender ao mesmo preço, passe a comparação, frango do campo ao preço de quem vendia frango de aviário.
As distâncias para os locais de consumo era o principal obstáculo à sua comercialização e os samarras ou as davam muito abaixo do custo de produção, tipo os marmelos de hoje, ou as deixavam cair e apodrecer nos pomares e daí terem feito a sua reconversão para vinhas e olivais.
As cooperativas de Pinhel, Vila Franca, Guarda e outras, que as calibravam e rotulavam, não souberam ou não puderam acautelar os interesses dos seu associados e também encerraram e assim, os terrenos dos pomares de macieiras deram lugar às vinhas e olivais a que o jovem se refere e que por enquanto ainda conhecemos.
E porque é que eram e são reconhecidamente melhores?
Logo os terrenos são diferentes, o clima é diferente, a água mais escassa, o sol tem outra luminosidade e calor de que as maçãs aproveitam, os ventos do Nordeste “o espanhol” que seca tudo, “de Espanha nem bom vento nem……. (não o completo porque suponho que haveria samarras que desmentiriam o fim do provérbio, por razões óbvias) e as macieiras tinham que lutar contra as adversidades dos terrenos, do tempo, os gelos, por vezes a neve e toda esta luta, tornava-as produto de qualidade excepcional.
Perguntem aos Chineses, sendo eles grandes produtores de mel, porque é que procuram comprar, toda a produção desta área de Rosmaninho que é considerada a maior da Europa e eles dir-lhe-ão, que o que se produz ali é do melhor que conhecem.
É aqui que entram os jovens da época das macieiras, o período em que muitos começam a estudar; assunto já tratado noutra crónica; pois também eles, indo de um meio com tantas necessidades, mas temperados pelo clima austero das dificuldades que os rodeavam, uns aproveitaram as oportunidades que se lhe depararam, outros furaram por aqui, por ali e procuraram alternativas, tal como as macieiras o faziam e muitos conseguiram ser alguém na vida, embora, e se me permitem, estas mais valias pouco tenham revertido para o colectivo da terra que nos viu nascer.

Em boa hora este blogue, veio permitir expor e partilhar inquietações colectivas e a sua reflexão e análise deveria merecer a atenção das autoridades locais e aproveitarem, algumas das sugestões e inquietações aqui reflectidas e tentarem consensos possíveis para a sua análise e possível concretização.
Ocorrem-me dois exemplos já aqui referidos: limpar e alindar o Monumento que é o chafariz da fonte; e outro de alguma envergadura: será que vão meter ombros ao monumento ao mineiro, uma época de quase 100 anos, que marcou a aldeia Samarra e por arrastamento muitas das aldeias do concelho de Pinhel?
E ainda: vemos escrever Santa Eumia, assim e assim Eumia, uma está errada. Também em devido tempo, permiti-me chamara a atenção para: Vale dE Massueime ou Vale dO Massueime! Em que ficamos? Será que já foi feita a correcção?

Nenhum outro fórum local tem sido tão oportuno e aberto quanto este para se exporem ideias e opiniões; é pena que os Srs. Administradores se vejam na necessidade de periodicamente, virem relembrar os comportamentos menos adequados nos comentários sobretudo na linguagem, obrigando-os a “deletes”. Se estes tivessem que assinar os comentários anónimos que expressam, estou certo que não o fariam; e mais, é minha convicção que muitos destes não terão tido como berço o “alqueire samarra” ou mesmo já as caminhas samarras. Com comentários a despropósito, também não podemos esperar que quem de direito leve a sério tudo o que se expõe.
É altura dos jovens pós macieiras, os que nos precederam, que mexam com algumas coisas, que serão de um consenso alargado desde que explicadas e consensualizadas. Se acham que exagerei, garanto-vos, à boa fé de quem sou, que me faltaram os adjectivos para colocar no devido lugar as maçãs dos pomares samarras.
Dos pomares das macieiras restam-nos as saudades das memórias visuais, gustativas e olfactivas dos seus aromas, dos jovens da era das macieiras, os jovens de hoje esperam o apoio para que também estes continuem a deixar a marca do seu crer e querer.


Setembro 2013 (29)
Apaulos

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  1. Pois muito bem, Apaulos! Parabéns pelo texto que aqui nos deixas, que prima e mais uma vez ,como é teu timbre, pela descrição fiel e pormenorizada, dos pomares da época.Fechamos os olhos e parece que estamos a visualizar um retrato, tipo mapa geográfico, que nos leva ao passado, já um pouco distante ( pelo menos para as gentes da minha geração). Mas é bom que seja lido, para conhecimento de uns e recordações de outros.Quanto ás sugestões, apresentadas no final, apoio incondicionalmente.A limpeza do chafariz, penso que não será assim uma tarefa difícil; quanto ao Monumento ao Mineiro( já em tempos por mim sugerido,de forma anónima( por razões óbvias), è mais difícil mas não será impossível. È preciso é muito boa vontade e querer, e não será necessário algo de sumptuoso...CR52

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  2. Nao nos podemos esquecer do monumento ao mineiro... havemos conseguir

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  3. nem parece que estamos em vésperas de eleições. Onde posso consultar as propostas da lista única? Espero que corra tudo bem com esta união forçada e espero que pelo facto de estarmos em minoria na assembleia de freguesia não nos cause contratempos. Onde é que já se viu ficarmos apenas com 3 lugares contra 4 mais uma má negociação

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    1. xiiiiiiiiuuu.. o assunto foi abafado........... politiquices..... ora o individuo muda de camisa (partido) como quem corta o cabelo (6 em 6 meses), é normal que nas negociatas faça tudo para ficar no poleiro, o problema é que de negociatas percebe pouco.

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  4. lindo documentário. Emocionante. Obrigado A Paulos.

    Luis

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  5. Afinal é Vale do ou de Massueime?
    Bom texto A Paulos, gostei do de tudo.
    Bem-haja

    Luis

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  6. um livro com as crónicas do A Paulos, porque não?

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  7. a zona dos Mortórios era fértil em maças bravo de esmolfe, mas há uma que gosto muito e que chamam de "quadros". É uma maça pequena e que vejo cada vez menos. Nas duas últimas décadas do século passado começamos a trazer produtos não autóctones. Alface francesa, alho francês, maça golden, etc. Macieiras nativas e que prosperavam aqui pela nossa aldeia foram abandonadas e viemos descobrir agora que são essas as que têm maior qualidade e no mercado são as mais caras. Bravo de Esmolfe é um exemplo. Estava na moda tudo que vinha de fora, o que é normal para um país que teve meio século fechado. Agora parece-me que estamos a voltar às nossas origens, e bem.

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  8. lembro-me de bons pomares na Lameira de Cima, este típico recanto samarra de lameiros, freixos e água à fartura que agora se encontra ao abandono.

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  9. DO Massueime se fosse rio, mas como é ribeira, não lhes parece que deverá ser: DE Massueime?....., Bem terão estado os padrinhos; Cerejo e Ervas Tenras, que batizaram a sua pimpolha de: Terras DE Massueime. E não é que pertencem todos ao meu Concelho!...

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    1. o wiki ajuda companheiro

      http://pt.wikipedia.org/wiki/Rio_Massueime

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  10. Esclarecida a dúvida para alguns, quanto a Rio ou Ribeira, aguardo que o apaulos ponha um ponto final no Do ou De da Freguesia e se for De, que os responsáveis façam a correção, quanto antes, agora que ainda deve haver poucos registos com esta denominação.

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  11. Nas freguesias do Concelho de Pinhel podemos ler:
    PALA - a 1,5 km da margem direita da Ribeira DE MASSUEIME,
    ERVEDOSA - situada na margem direita da Ribeira DE MASSUEIME,
    ALVERCA DA BEIRA - Assoc. de Caçadores DE MASSUEIME,
    AUTARQUICAS de 2013 - Guarda- Pinhel- Freguesia de Terras DE MASSUEIME,
    EDM - Area Mineira DE MASSUEIME,
    A Mina DE MASSUEIME.
    Ms também podemos encontrar:
    SORVAL OU TENDILHÂO ...que se precipita sobre o rio Massueime, "Que não é RIO"
    ASSOC. Cultural, Desportiva e Social DO VALDEIME,
    Alguém dúvida que a origem do pecado original está aqui!...
    Façam a correcção, quanto antes, junto dos novos Orgãos Autarquicos e junto do D.R.
    Saudações.

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  12. Dia 03.11.2013, Na TVI à tarde em Mangualde; uma produtora com umas caixas de maçãs em frente dizia: "com maçãs da Beira Alta nada nos falta".

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  13. Se não leram, leiam ou releiam que vão gostar e quanto ao do ou De o Apaulos já provou que é RIBEIRA logo DE MASSUEIME Saudações.

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