Santuário, é um lugar ou templo sagrado, onde vão peregrinos, outrora romeiros, e no qual se veneram relíquias ou imagens de Jesus Cristo, da Virgem Maria ou de santos.
Os diferentes títulos Marianos, geralmente ligados a Santuários onde os devotos vão peregrinar para pedirem ajuda para as fadigas da vida, diversificam o nome de Nossa Senhora; a Ermida da Senhora das Fontes é o Santuário Mariano, onde os Samarras veneram a Virgem Mãe Nossa Senhora, sob o nome de Senhora das Fontes.


Santuário em três vistas (2014).


Ermida da Senhora das Fontes vista por trás (2014).


Ermida é isso mesmo, um lugar ermo, fora da povoação, com um santuário maior ou menor, pode ser uma simples capela, pode ser relativamente recente ou vetusta, ou mesmo muito vetusta, como é a Ermida da Senhora das Fontes, onde afluem os peregrinos, de todas as condições vindos de perto ou de longe, com mais ou menos fé, o que não é mensurável, mas todos são tratados da mesma maneira, porque eles vão-se dirigir à Virgem Mãe e o diálogo será entre eles.
Os Samarras têm três Ermidas, bem vetustas e uma com apenas 32 anos.
Aquela onde se venera a Virgem Maria, sob o nome de Nossa Senhora das Fontes é uma ermida que se localiza ao lado daquela que foi a estrada militar, Almeida a Lamego, hoje a principal saída da aldeia de Santa Eufêmia, pelo Este, a 1 km desta, à qual pertence conforme sentença de 1646 do Juízo
Eclesiástico da Diocese de Viseu à qual pertencia.
Neste local, em tempos remotos, Nossa Senhora foi invocada sob o título de “Nossa Senhora da(s) Cabeça(s)”, cujo nome lhe advêm de ter aparecido, no pico da Serra da Cabeça em Audujar –
Espanha em 12 de Agosto de 1227, a um jovem pastor  “maneta” de nome João Rivas e tem santuários em sua honra, nomeadamente em Espanha, Portugal e Brasil;  conta  a lenda, para que os espanhóis acreditassem na versão da revelação ao jovem pastor, a “SENHORA”  restituiu-lhe o braço direito que havia perdido, para que as suas palavras se tornassem credíveis. 

A Villa Romana do século IV-V, localizada no sítio da Torre, também conhecido como Tapada dos Ermitães, a cerca de 400 metros da Ermida, em voo de pássaro e o pequeno bosque que existiu neste local, onde os centenários cedros, ciprestes e outras espécies ainda se mantiveram até 1941, bem como as fontes de água, sugerem que, aqui, em tempos da idade média, poderá ter existido um local de culto a Diana, deusa da caça e dos bosques, ou a outra divindade romana, antes da Capelinha a Nossa Senhora.
Desconhecemos a data da implantação da pequena e humilde capelinha, onde, como ficou referido, em tempos remotos, a Senhora foi invocada como “Senhora das Cabeças”, nome pelo qual ainda é venerada em muitas localidades, nomeadamente em Seixo Amarelo com a festa a 14 e 15 de Agosto (em 2014). 

Cruzeiro que referência o local da primitiva capelinha (2014).

A velha capelinha estaria instalada no sítio onde se encontra o cruzeiro, entre as duas capelas, no segundo patamar do recinto, marcando assim a sua localização e cuja linha de água, à época, passaria muito perto.
A capela primitiva era demasiado pequena e humilde e já não servia devidamente os peregrinos que à Virgem se dirigiam em dias de Romarias; na Festa da Ascensão do Senhor, ou do Senhor da Pedra em Maio, ou inicio de Junho, dado que é uma festa móvel e em 8 de Setembro dia da Sua Romaria “Nossa Senhora das Fontes” e aquando dos invernos rigorosos, por vezes, era invadida e alagada pelas enxurradas do ribeiro, mais tarde desviado para o limite da cerca e desde 1977 enterrado em túnel, aquando da terraplanagem do recinto exterior; a tarefa levada a cabo, teve como entusiastas um grupo de jovens estudantes que mobilizou a população, com vista a dar um ar renovado ao recinto, para se comemorar a década do bicentenário da inauguração da Capela Principal, 1771-1977.
Em 1965, sendo pároco o Pe. Carlos Moita, já se havia começado a arborizar o recinto, nomeadamente com; cedros, ciprestes e faias que embelezam o Santuário, fazendo sentir a sua sombra que, em dias de canícula é muito apreciada, propondo-se repor na medida do possível, aquele que foi um bosque tantas vezes referido e sonhado.

1786
1853
10.3.1877

 Datas nos portais das casas do ermitério (2014).







Após várias décadas de abandono do ermitério e algum desleixo no cuidado do recinto, em 30/08/2010 um grupo de jovens com o propósito de fazerem algo por este património, constituíram a Associação “Confraria dos Ermitães”, em cujos estatutos se pode ler: promover e defender a tradição e o património histórico de Santa Eufêmia e em especial o património da Ermida de Nossa Senhora das Fontes. Para que conste, regista-se que os seus primeiros Presidentes, são os jovens: Sérgio Raposo Paula, da Assembleia Geral e José Fernandes da Direcção, que apoiados pelos, cerca de 200 associados (2014), têm procurado dar corpo à letra dos estatutos. Se recordarmos que a aldeia tem uma população de cerca de 140 residentes e cada vez mais envelhecida, o nº. 200 associados é bem o espelho de quanto os Samarras na diáspora gostam do chão onde têm as suas raízes.
Alguns destes jovens da Associação, também já tinham criado o blog “OSamarra” em 11/11/2008, dos quais destaco o José Fernandes e Sérgio J. Paula, que nos tem permitido, manter-nos em contacto, sobretudo aos que estamos na diáspora.

A Comissão Fabriqueira da Igreja em 2013/2014, sendo pároco o Pe. Ricardo Fonseca, mandou proceder ao restauro das pinturas no interior da Capela-Mor, estando em fase de conclusão e o custo da adjudicação dos trabalhos é de cerca de 90.000€.


O tecto da capela em fase final de restauro(2014).


Esta capelinha, quando Santa Eufêmia era um curato anexo à paróquia das Souropires, era a matriz de Santa Eufêmia e em 1740, já com o Irmão Ermitão Manoel de São José na Ermida ela ainda existia naquele local, pois, foi ele que tomou sobre os seus ombros a tarefa de edificar a nova capela, que foi concluída em 1771, 30 anos depois de ter obtido a autorização para tão grande feito, continuando a ser a matriz de Santa Eufêmia, até à construção na aldeia, daquela que viria a ser a matriz, a Igreja de Santo André e mais tarde, após a cedência pelos fidalgos, da sua capela à povoação, estes fizeram dela a sua Igreja matriz.
Em “A Última Ermitagem” de 1917, D. Maria M. T. Martel Patrício, deixou-nos algumas notas dignas de destaque que, Ilídio S. Marta refere na sua obra “A Ermida de Nossa Senhora das Fontes” de 1941.
 O primeiro Ermitão que se fixou na Ermida da Senhora das Fontes, foi o Irmão Manoel de São José, desconhecendo-se a sua procedência e as razões que o levar a abraçar esta vida, corria o ano de 1740. Alvitra-se que seria de boas famílias, era culto e foi bondoso e estimado em todos os locais por onde esmolava para o santuário, desde as terras de Vila Nova de Foz-Côa às terras do Sabugal e raia de Espanha e pelos romeiros de quem granjeou admiração e confiança, por tudo o que dizia e pela obra que estava a construir e que nos legou.
 Os Ermitães pediam para dividirem com quem mais precisava, estava lançado o embrião para uma “Santa Casa da Misericórdia, ou hospício religioso”, mas esta história já foi referida na primeira parte da crónica e não se veio a concretizar.
O Santuário, além da Capela-Mor construída em hexágono, tem por fora, numa parte do hexágono, um complemento de construção em meio círculo, para servir de sacristia; é composto de mais duas capelas, no patamar logo a seguir às escadas, uma à esquerda de quem está virado para a capela principal, dedicada a S. Francisco das Chagas e a da direita dedicada a Santa Maria Madalena.

Capela São Francisco das Chagas.
Data no altar 1826.

Capela Santa Maria Madalena.














O exterior e interior das duas capelas (2014)


A Capela-Mor tem por cima do portal principal um magnífico nicho que acolhe Nossa Senhora de Graça e no topo do beiral do telhado uma soberba cruz, única na região e ao que consta, apenas existe duas comparáveis a esta em Portugal.


Em granito e toda rendilhada (2014).
 
 É uma cruz em granito, toda rendilhada o que faz dela, uma obra-prima e muito admirada, encontrando-se enquadrada por dois pilares que prolongam as duas colunas mestras frontais desta parte do hexágono.
Por dentro, no altar, está a imagem da Nossa Senhora das Fontes, no seu vestido branco e manto azul e a coroa que lhe é devida, de Rainha de Mãe do Céu.


A senhora das Fontes no seu trono.

 O Santuário está integrado num conjunto de casario, o ermitério, ainda que separado por um muro, onde se encontra a torre sineira com os dois pilares e cruz e os arcos onde deveriam estar dois sinos, mas que, eventualmente, o seu bronze terá sido derretido para dar lugar a um busto de algum politico da época da rapina; ermitério esse que teve cerca de 10 quartos e o que ficava mais perto da capela, era o do bispo de Pinhel, D. Bernardo Bernardino Beltrão, da linha dos fidalos de Santa Eufêmia, que ali passava longas temporadas, salas para acomodar os hóspedes eventuais nas refeições e que teve ligação directa à Capela-Mor pela sacristia, por uma passagem superior, estrutura que no último quartel dos século XX, foi desmontada, pois também já não se justificava, porque o ermitério já estava desactivado e para permitir que as bandeiras, guiões e estandartes pudessem circundar a Capela-Mor, aquando das procissões-

Os últimos residentes no casario do ermitério, foram os pastores dos arrendatários das propriedades da Ermida da Senhora das Fontes, o Ti Augusto Fernandes “Lebre” e sua esposa D. Emília e filhos, ao tempo em que estavam ao serviço dos arrendatários os Samarras: Ti Augusto Carapito e Manuel José Monteiro, cujo contrato de arrendamento, por 6 anos, foi celebrado em 01/11/1951 com termo em 1957, com a renda anual de 4.500$00 e assinado pelo Presidente da Comissão Fabriqueira o pároco, Pe. José Bernardo dos Santos, nesta data ainda entre nós e residente na Cerdeira do Côa.
Presentemente a Cerca Grande, excepto o seu olival e a Tapada dos Ermitães são objecto de arrendamento bianual com a renda anual de 800€ (2014). 

O ermitério está em ruínas, como de resto acontece a muitos outros, sobretudo no Norte do País, que foi a zona onde mais se fixaram os abades, monges e freiras e onde construíram os mosteiros e conventos.
Quando de Roma, os superiores das ordens religiosas mandavam os seus monges a estabelecerem-se num outro país, eles perguntavam-lhes e onde nos vamos instalar?
Ele respondia-lhes, perguntai ao céu e eles vos dirá e de certo, que o céu fazia sempre a mesma sugestão, porque eles instalaram-se sempre em locais onde havia um curso de água, ou boas nascentes, rodeado de bons terrenos, porque o “ora et labora”, assim o recomendavam. Esta máxima está espelhada nesta nossa Ermida; boas nascentes de água e boas terras agrícolas, como as granjas “cercas” adstritas à Ermida e outras propriedades.

Logo que os donativos começaram a afluir, o Ermitão Manoel de São José procurou dar sentido à ideia que vinha amadurecendo, que era edificar um templo para a “SENHORA” que pudesse responder às necessidades dos romeiros e à dignidade que a “Virgem” merecia, substituindo assim a velha capelinha.
Consultou o Bispo de Viseu D. Luís Coutinho, que lhe mostrou toda a abertura e lhe deu alento e coragem para tão grande iniciativa.
Trinta  anos após a sua chegada, a Romaria de 8 de Setembro de 1771, já com a imagem da “SENHORA” transladada da velha capela, foi celebrada no novo templo, graças aos donativos dos peregrinos que vendo a obra a crescer, a áurea de santo e bondade de que o Ermitão gozava, nunca deixaram de o apoiar.
A licença para a bênção da capela havia sido solicitada em 13 de Maio de 1771, 146 anos antes da “SENHORA” aparecer em Fátima aos 3 pastorinhos.
O Bispo mandou investigar tudo o que lhe pareceu por bem e necessário e o Abade Alexandre Manoel de Sousa, delegado do Ordinário, da Póvoa de El-Rei, em 23 de Maio do mesmo ano, respondeu ao Bispo de Viseu,….  estar a capela concluída e inteiramente capaz de nela se celebrar com toda a devida decência….. e por ser verdade mandei fazer esta que sendo necessário juro “in verbo sacerdotis”.
Oito dias depois estava lavrada a licença: Pela presente concedo licença ao Rev. Pe. António José de Carvalho e Vasconcellos, que era filho do fidalgo de Santa Eufêmia, Luís Carlos Freire de Carvalho e Vasconcelos; para que possa benzer a capela da Milagrosa Imagem de Nossa Senhora das Fontes, sita em o limite e junto do lugar de Santa Eufêmia, deste bispado e depois de benta se possa nela dizer missa, visto me constar que é decentemente cómoda e que tem os paramentos necessários. Esta será registada no livro do registo da Câmara. Dada em Viseu sob o selo de S. Exa. e meu sinal, do primeiro de Junho de 1771, Pe. Jerónimo Fernandes Prata, Escrivão da Câmara a subscrevi.
(Selo Branco do Bispado).
Parte do sonho do Ermitão cumpria-se. 
Este Sacerdote faleceu em 27/03/1775 e foi sepultado na capela do Solar. 

As esmolas dos romeiros, o esmolar de porta a porta, por terras bem distantes desta, pelos Ermitães, de cuja fama de santidade, justamente gozavam, permitiram fazer esta obra e este Santuário, que o tornam até aos dias de hoje, o mais belo Santuário da região.  
A diocese de Pinhel criada em 21/06/1770 pelo Papa Clemente XIV a pedido do Rei D. José I e o seu primeiro Bispo nomeado foi D. Frei Rafael de Mendonça que não chegou a tomar posse, pelo que o primeiro, que tomou posse, foi D. Cristóvão de Almeida Soares de Brito 1771, indicado pelo Rei e que faleceu 11/2/1782. A este sucedeu-lhe D. José António Pinto de Mendonça Arraes (18/7/1782 a 1792), data em que foi transferido para a Guarda e que foi o mais notável bispo de Pinhel. Sucedeu-lhe então o já referido D. Bernardo Bernardino Beltrão, que pertencia à família dos fidalgos de Santa Eufêmia, em 23/3/1797 e faleceu em 19/7/1828. Este já tivera dificuldades com as autoridades liberais em 1823 e sucedeu-lhe aquele que viria a ser o último bispo de Pinhel D. Leonardo de Sousa Brandão, que teve de andar fugido e que faleceu 1838. Depois passou a ter Governadores Eclesiásticos e o mais notável foi António Mendes Belo, futuro Bispo do Algarve e Patriarca de Lisboa.  
A diocese foi extinta por Leão XIII a 30/09/1881. In: (Das Prelaturas Politicas às Prelaturas Pastorais – o caso de Pinhel-), por quem viria a ser nomeado Bispo auxiliar de Lisboa 6/11/1999, com o título de Bispo de Pinhel de 1999/2007, tendo sido ordenado Bispo em 22/1/2000 e hoje é o 17º Patriarca de Lisboa desde 18/05/2013, tendo tomado posse em 07/07/2013, D. Manuel Clemente).
Com esta descrição poderemos compreender melhor, os pedidos de autorizações feitos pelos Fidalgos e Ermitães, sobre as capelas, às dioceses de Viseu/Pinhel e as concessões obtidas na sequência daquelas e demais documentos endereçados pelos Ermitães a estas dioceses de quem dependeram. 
Agora, após a Lei do “Mata Frades” e o desaparecimento dos Irmãos Ermitães, a Ermida faz mais jus ao seu nome de “Ermida”.
O primeiro Ermitão terá falecido no ano de 1777, sem que se soubesse quais as suas origens, nem qual a motivação que o levou a tomar esta gigantesca tarefa sobre os seus ombros.
A recompensa, terrena, da sua dedicação foi ter ficado para sempre na Capela da Ermida que edificou. 

As casas e casebres, onde há mais de 2 séculos os fidalgos mandavam acolher e dar hospedagem a pobres, caminhantes e romeiros, foram doadas de promessa à Capela, bem como algumas propriedades, para que a Senhora das Fontes tivesse os meios necessários para dar continuidade a estas acções, prover o sustento dos Ermitães e cuidarem da Ermida da Nossa Senhora das Fontes.  
A doação e a aceitação da responsabilidade de dar continuidade a estas acções filantrópicas, diríamos hoje, que os fidalgos, aqui, mandavam praticar junto dos pobres, viandantes e romeiros, até à doação dos bens à Ermida, na pessoa do Ermitão Manoel de São José, pelo fidalgo Manuel António Cortez de Carvalho e Vasconcellos, (falecido em 2.2.1793 e sepultado na sua capela do Solar), encontram-se representadas no tecto do coro da capela; em que o Fidalgo de calção, casco e cabeleira de rabicho, levando pela mão suas três filhas; D. Maria Antónia, D. Francisca e sua irmã gémea D. Josefa Maria e apresentando com a outra a sua mulher D. Francisca de S. Payo Tovar e Noronha, que faleceu a 28.04.1756, fazem todos voto de entrega ao santo Ermitão, que de Joelhos, o recebe.

Os ciganos e indigentes não podiam ser acolhidos no ermitério, no entanto, não recusavam ajuda a ninguém e por isso construíram casas e alpendres no exterior dos muros para eles e seus animais.
O último cigano-soldado, soldado da 1ª. G. Guerra, foi o Luís Maria que frequentemente e por temporadas mais ou menos longas até à ultima década do século XX, aproveitou o aconchego do cabanal, para ali se acolher com a sua Luísa e carroça onde transportavam os seus parcos tarecos. Também referenciado em crónicas anteriores.

O registo do que havia de ser o património da Ermida que, em parte, havia sido legado ao primeiro Ermitão Manoel de São José pelos Fidalgos, foi passado aos Irmãos Ermitães Manoel da Graça e Domingos de S. José; estes, por escritura lavrada em 15/04/1807, no escritório do Notário de Pinhel, Diogo da Silva Soeiro, doaram todos os bens imóveis e móveis, passando a ser dote e património da Capela à Ermida de Nossa Senhora das Fontes, cumprindo assim o desejo do Ermitão Manoel de São José e que ele já não pudera concretizar.
Estes Ermitães já serviam a Capela há algumas dezenas de anos.  
Por via desta escritura, foi possível conhecer as origens destes Irmãos Ermitães: Manoel da Graça, solteiro, sui júris de idade que disse ser de 72 anos de idade, natural da Quadra, Vila de Unhais, Bragança e Domingos de São José, solteiro, sui júris de idade, que disse ser de 53 anos, ser natural da vila de Mondim de Basto, Vila Real e moradores na Ermida da Nossa Senhora das Fontes no lugar de Santa Eufêmia, onde servem de Ermitães.  
Por testamento de mil oitocentos e trinta e quarto aos dois dias do mês de Janeiro (2/1/1834), reparem como já escreviam o que hoje andamos a tentar fazer e umas vezes fazemo-lo e outras não, o Irmão Domingos de São José, com os seus 80 anos e 50 de Ermitão, pressentindo que já estava a chegar ao cume da montanha, e por estar doente de moléstia que Deus Nosso Senhor foi servido dar-lhe, mas de que em seu perfeito juízo e entendimento; mandou vir o tabelião de Pinhel, Manoel Monteiro de Seixas e perante ele e demais testemunhas disse: que constituía aos Irmãos José de São Paulo, Pedro de Jesus e António das Chagas, por herdeiros usufrutuários de todos os bens móveis e do mais que tenha adquirido como Ermitão desta Ermida de Nossa Senhora das Fontes.
Por morte dos mesmos ou deixando de serem Ermitães desta Ermida, os bens moveis e imóveis passarão para a “Confraria do Santíssimo Sacramento” da mesma freguesia de Santa Eufêmia e que os Mordomos da dita Confraria se encarregarão da conservação do culto à Mãe de Deus neste lugar, bem como da guarda de todos estes bens, enquanto não houver ermitão legitimamente constituído. 
Este testamento ficaria sem efeito, se e logo que se verifique a fundação nesta Ermida de um Colégio de Missão, como se projecta e para o que se tem requerida Licença Régia, para quem ficariam todos os bens. 
Que o Irmão Ermitão José de São Paulo, por ser o mais velho tanto na idade como no hábito, seria sempre considerado como o superior.  
Como verificamos a simbiose entre os Abades, Fidalgos e Ermitães foi uma realidade, uns dando andamento aos intentos e procedimentos dos outros.
Que nunca nesta Ermida pudesse ser admitido como ermitão homem casado ou mesmo viúvo tendo filhos. 

Também, quando os Ermitães procuravam, lavradores e trabalhadores para os ajudarem no amanho e cultivo das terras ou para cuidarem dos animais, só recorriam a homens.  
Um dos lavradores que, com a sua junta de vacas, aí pelos anos 30 do século XX, era solicitado para estas tarefas, foi o Ti João Mendo que faleceu em 1958 com 78 anos de idade.
Verifica-se que os Ermitães, que se seguiram ao Ermitão fundador da Casa, continuaram a ser dignos do espírito do seu fundador. 
À data da publicação do Decreto que extingue as ordens religiosas em 30 de Maio 1834, o Irmão Domingos de São José ainda vivia, enquanto o Irmão Manoel da Graça já tinha falecido e ambos foram sepultados em túmulos paralelos na capela ao lado esquerdo.
Por Portaria de 30 de Dezembro de 1834, assinada pela Rainha D. Maria II, em conformidade com outra de 19 de Dezembro do mesmo ano. As autoridades de Pinhel julgando a Ermida da Senhora das Fontes, abrangida pela letra do Decreto de 30/05/1834, foram ao santuário e espoliaram-no de tudo o que tinha valor. 
Porém, aos rogos do venerável Ermitão, os bens respeitantes ao ermitério e de culto da capela, foram, em parte, restituídos à Ermida pela Câmara de Pinhel, ficando esta apenas, a administrar as propriedades. 
Não obstante uma portaria do Ministério da Justiça de 15 de Maio de 1930, que mandou que a Câmara de Pinhel devolvesse à Ermida de Nossa Senhora das Fontes, da Paroquia de Santa Eufêmia, todos os bens que haviam retirado; em 17 de Abril de 1951, somos alertados pelo repenicar dos sinos a rebate, como acontecia quando nos chamavam para apagarmos um fogo; os meus pais e eu, com os meus 7 anos, largámos o que andávamos a fazer na Lameira de Cima e encaminhamo-nos para a aldeia, mas ali pelo Ribeiro Castenheiro, o “Ribeiro Troca Tintas”, já encontrámos alguns Samarras, que pela linha de água e para fugirem da estrada vigiada pela GNR, procuravam atingir a Ermida sem serem vistos, o grito dos sinos era para acudirmos à Senhora das Fontes que estava a ser roubada no seu património pela Câmara de Pinhel. 
Desta vez, o objecto da cobiça eram as preciosas madeiras, que resultaram do derrube de árvores centenárias, pelo ciclone de 14/15 de Fevereiro de 1941, nomeadamente os grandes cedros, que embelezaram e faziam parte do património deste Santuário. Neste dia de Abril, perguntava o Valdemar F. Tomás nos seus 6 anos, aos guardas que à entrada da aldeia impediam que alguém tomasse o caminho da Ermida; então os senhores, porque vieram? Viemos porque nos disseram que andavam a roubar a Senhora das Fontes, respondeu deixando transparecer um sorriso amarelo, in “Senhora das Fontes O Encanto de Gerações – de Valdemar F. Tomás - 2003”. 
Outro património da Ermida encontra-se no Museu de Pinhel, nomeadamente, quadros com os “ Ex-Votos”, costume que deixou de se praticar e parte desse património ter-se-á perdido no caminho de Santa Eufêmia para Pinhel ou aquando do hipotético inventário!..  
Uma vez mais os valorosos Samarras, foram presos por defenderem um património que era seu e que sempre puseram à disposição de quem vinha por bem.


Quadro de Ex-Voto.
 
 Eram representações escultóricas, que pretendem demonstrar as situações dos devotos e miraculados que recorreram, nas suas aflições, à intercessão da Nossa Senhora das Fontes.

O último Ermitão que muitos Samarras, ainda vivos, conheceram e a quem, quando garotos o iam visitar, aí pelos anos 1930, ele oferecia-lhes uma bolacha, foi o Irmão António das Chagas, do Toito, freguesia da Ribeira dos Carinhos – Guarda. 
Com o desaparecimento dos Irmãos Ermitães da Ermida, as grandiosas festas da Ascensão do Senhor ou Senhor da Pedra em Maio e Senhora das Fontes em 8 de Setembro foram perdendo brilho; os arraiais, os pastores que levavam os rebanhos à bênção da “SENHORA”, as acções filantrópicas que ali se praticavam e mais recentemente, por causa dos incêndios, a proibição das descargas de foguetes que ajudaram a engrandecer as romarias à Ermida da Senhora das Fontes, já são memórias de um passado que vai ficando, cada vez mais longínquo.

Os Samarras que aqui veneram a ”SENHORA”, todos os anos lhe fazem a Sua festa, por norma, no primeiro domingo de Setembro para que não se junte, praticamente, à festa de 16 de Setembro em honra de Santa Eufêmia, e que em anos anteriores, mas não muito distantes, se celebrava sempre no dia 8 de Setembro, dia da Natividade de Nossa Senhora.
 As comemorações festivo - religiosas, começam na véspera com a procissão a sair da aldeia, com bandeiras e estandartes, ao fim da tarde, até ao santuário onde é celebrada missa campal com  sermão.


Procissão da Senhora das Fontes (2012)

 No dia seguinte, o dia da festa, cerca das 12h00 começam as cerimónias com a celebração da missa campal e sermão, finda a qual, organiza-se a procissão com as bandeiras, estandartes e o andor com a imagem da Virgem Senhora das Fontes que desce a estrada, outrora a alameda de cedros, até ao cruzeiro, a caminho de dois séculos e meio, que contorna e abençoa a aldeia a seus pés, retornando ao seu santuário. 


    
Cruzeiro a caminho do tricentenário (2014)  


 Era costume em tempos idos, os Samarras fazerem almoços à sombra das árvores, para assim ficarem mais perto das actividades que após o almoço se realizavam. Os cedros que hoje protegem este lindo Cruzeiro, são dignos sucessores dos seus pares e antepassados e mesmo parecendo adormecidos, ali estão para nos demonstrarem como eram, sem que tenhamos de sonhar como seriam, se é que acreditaríamos que assim foram. Também naquele dia negro de 15 de Abril 1951, um deles, deu abrigo a um valoroso Samarra, que escapando-se do jipe da GNR, trepou por ele acima e ele escondeu-o no meio da sua copa, ludibriando assim a vigilância do guarda.

 Não queremos terminar esta segunda parte da crónica, sem reproduzirmos o que a nossa memória visual nos recorda; um ou outro cedro e cipreste meios estropiados, ou mesmo só parte dos seu troncos, que os ventos ciclónicos não derrubaram por completo, mas que não resistiriam por muito tempo aos maus-tratos da fúria do redemoinho dos ventos de que tinham sido vitimas; também eles protegeram com as suas sombras as glicínias que emolduravam e calafetavam aqueles muros de cumes arredondados, fazendo daquele espaço um lugar belo e de sossego e de bem nos sentirmos. A chamada cerca pequena, a que fica junto do santuário, era um lugar de aprazível regalo para os olhos e olfacto, com os seus jardins de bucho, quais labirintos e rosas, as rosas que haviam de ornar o altar da “SENHORA”. Era à sombra dos cedros e ciprestes com o agradável odor das glicínias, que os romeiros ouviam as palavras do pregador que empolgavam os crentes e mantinham atentos os garotos.

 Como na próxima crónica vamos visitar as outras ermidas e descer para a paróquia/igreja, espreitemos os últimos motivos dignos de registo neste local; 

 Dois pedestais de cruzeiros (2014)


 O primeiro cruzeiro encontrava-se à entrada do espaço da ermida, mais tarde veremos o porque neste local e encostado às paredes do cabanal, cruzeiro que ainda recordamos e que foi derrubado, aquando do alargamento do caminho para o alcatroamento da estrada e o mesmo nunca mais foi reposto, tendo o pedestal, mais tarde, sido recolhido e guardado algures, onde foi registado para esta; o outro encontra-se no espaço do recinto.


Chafariz na Senhora das Fontes 1853 – (2014)

 O belo chafariz, que matou a sede a muitos que por ali passaram e aos animais e rebanhos que procuravam as suas águas frescas, cujas sobras fizeram crescer, na cerca, muitos alimentos que mataram a fome aos pobres e caminhantes que ali pediam ajuda. Antes da estrada e da terraplanagem do recinto exterior, o tanque deste chafariz com mais de século e meio estava ao nível do recinto, que agora nos recorda como era e recebe directamente a água da fonte de Nossa Senhora, agora encerrada na sua nascente. Desconhecemos quem terá sido o inquilino/a do nicho, que alguém em puro acto de vandalismo terá expulsado, bem como derrubado a cruz que o encimava.
Junto deste, encontra-se uma placa granítica datada de 1986 e parcialmente enterrada, onde estão gravadas duas quadras, do nosso poeta popular ”J. Carapito” e que sugerimos que seja incrustada na parede ou eventualmente no nicho do chafariz para que não se perca.  


Foto (2014)

 Vem beber água pura
Na Senhora das Fontes
Santa e milagrosa
Vinda dos Montes

Nunca passes sem rezar
À Senhora das Fontes
Divulga o seu nome
Em todos os horizontes.


Foto (2014)

Para comemorar e perpetuar a peregrinação de Nossa Senhora de Fátima à Diocese da Guarda e à nossa, Santa Eufêmia em 01.03.1992, foi-lhe erguido este singelo monumento. Adivinha-se uma nova passagem da imagem peregrina da Virgem de Fátima, para comemorar o centenário das suas aparições em 2017.

Reportam-nos, que, quanto aos dois cruzeiros de referência, um foi feito pelo mestre e outro pelo oficial, sem que um pudesse ver o trabalho do outro; qual o do mestre, qual o do oficial aprendiz?...

Os “Valores e as Relíquias” quando caem no esquecimento, são ofensas ao passado, presente e futuro, no entanto, a vivência que nos transmitiram e modestamente, aqui referida e testemunhada ainda por muitos, no que se reporta à Ermida, arriscamo-nos a profetizar que, a Ermida da Nossa Senhora das Fontes, que sempre foi acarinhada, estimada, vivida e respirada por todos os Samarras, ao longo destes séculos, o continuará a ser, enquanto um Samarra respirar.


Continua na 3ª parte
Outubro 2014 (44)
Apaulos



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  1. O que este Samarra nos vem mostrando com as suas crónicas, que afinal põe a descoberto muita coisa que nos narravam ao deleve e que iam ficando muito esbatidas na nossa memória longincua, mas que agora com estes registos e datas ficamos aconhecer os fundos do nosso torrão natal. Um Grande Bem-Haja.

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  2. mais uma grande lição de história. Obrigado.

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  3. O maior elogio é: aguardo já a continuação da história da minha/nossa terra.
    Muito bem Sr. APaulos pelo trabalho que aqui nos deixa. Obrigado tb. ao Blog e seus Administradores.

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  4. Pelo relato, os Ermitães ganharam a confiança e respeito dos Romeiros, porque eram fieis à sua palavra/missão. Será que eles esgotaram todo o plafound e não sobrou nada para nós?
    Sr. António parabéns pelo trabalho que aqui nos tem trazido.

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    1. devido ao efeito da globalização nas últimas décadas cruzaram-se muitas raças e perdeu-se um bocado a verdadeira cepa samarra

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  5. Sugestão: Coloquem 4 pedrões em volta deste lindo Cruzeiro, dos cedros, ligados por uma corrente de ferro para o protegerem.
    Saudações Samarras

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    1. ~quão vasto é o nosso património.
      boa ideia

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  6. "a alameda de cedros" que bela imagem seria.

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  7. uma alameda de charcas, quão bela imagem seria.

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  8. Muito interessante completa alguma informação que tinha sobre a senhora das Fontes onde em pequeno ia com a minha mãe montado na burra desde a Malta passando Souropires e Reigadinha

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